Tem muita gente que reclama que se vê problema em qualquer lugar que se possa olhar. Eu não penso assim. Ponderamento é algo que acompanha discernimento, talvez seja até mesmo um irmão gêmeo. Quando vi essa notícia sobre a acusação de que um anúncio da Kia Motors, premiado em Cannes, neste ano de 2011, na categoria press continha um acentuado teor de incentivo à pedofilia precisei sim averiguar com meus botões e óculos. Criação da MOMA Propaganda, o “objetivo” do comercial é promover o ar condicionado dual zone da marca de automóveis, etc. Abaixo seguem as imagens. Tem ou não tem consistência essa relação entre um adulto visualizar uma criança como uma verdadeira sex machine?
Discute-se muito a liberdade de expressão hoje nas redes sociais, talvez como nunca antes na história de todos os países, diria o Ex-Presidente Lula. E parte das discussões envolvendo a liberdade de expressão se relaciona de forma direta aos limites que devemos ter em relação não apenas às ideias que compartilhamos (ou não), mas ao respeito e a dignidade que devemos sim manter – do contrário, as saídas serão cada vez mais distúrbios de todas as naturezas. E porque raios estou dizendo isso? Simples. Esse comercial premiado da Kia Motors tem sim uma clara referência à transformação que o olhar do sujeito – homem (veja-se, o homem) tem sobre o objeto-criança. E essa transformação visual (interna, na mente do sujeito-cliente alvo da propaganda) relaciona-se ao poder e dominação. O que passa a existir na frente do sujeito-homem é apenas o alvo do seu desejo, o sexo com a mulher, mesmo que “a mulher” seja uma criança. É semiótica básica. É claro, também, que um comercial destes não irá acionar um botão imediatamente e transformar uma série de homens desejosos de ter esse automóvel com ar-condicionado em pedófilos de plantão. Não. Mas vai estimular, cada vez mais, a visão objetificante que se propaga das mulheres como objetos sexuais (é só ver o caso das propagandas de cervejas) e mais: naturalizar a adultização das crianças.
Podem até me dizer que é “papo brabo” esse lance de “adultização” das crianças, mas acredito que o buraco é mais embaixo. Só não vê quem não quer. Vem lá de alguns anos atrás quando a infame dança na “boquinha da garrafa” atingiu um sucesso em nível nacional e visualizar crianças praticando o horror daquela dança (sexualidade infantil sempre existiu, o charutudo do Freud ja dizia isso, mas adultos se aproveitando descaradamente e comercialmente da sexualidade infantil é outra coisa) foi aos poucos se naturalizando pelo Brasil. Então, nada mais natural que essa propaganda contenha esse teor de objetificação sexual da mulher e também que as crianças sejam vistas como propensos objetos sexuais neste mundo maluco onde tudo pode ser comercializado. É de lamentar.